terça-feira, 1 de maio de 2012

The Last of England (1988) de Derek Jarman


Visão apocalíptica, muito pessoal, de Jarman sobre o seu país. Ruínas, muros (mais do que em Berlim, diz o narrador, em off, a certa altura), vermelho de sangue e vermelho do fogo, fogo das tochas e fogo das armas, fogo da Bomba e do céu, homens encapuzados, gangs à deriva... É este o cenário da Londres "em chamas" de Jarman. E é, num carrossel diabólico de imagens, que o realizador inglês "monta", às camadas, a sua crítica, cheia de barroquice avant-garde, ao Thatcherismo, a uma sociedade que tende autofagicamente à dissolução dos seus valores de liberdade e tolerância, ainda sob o fantasma do nazismo (até parece que Hitler, que ouvimos a discursar na banda de som, ganhou a guerra!)... As velhas viúvas parecem controlar as operações do grupo terrorista que fuzila o protagonista. Parece ser por ele que a noiva (Tilda Swinton) dança, à luz da fogueira, rasgando simbolicamente a sua roupa, como que expressando o sentimento de desolação, de fim de linha, deste país que enluta o amor, permanentemente.

"The Last of England" vive de todas estas visões infernais, tece a sua teia de imagens baseando-se numa retórica audio-visual (propositadamente) esotérica, mas sempre de "nota única", que não cessa, aqui e ali, de nos hipnotizar tanto quanto, aqui e ali, nos mói. Derek Jarman, aquele que César Monteiro um dia apelidou de "paneleiro sem talento", não é um cineasta de todo desinteressante, mas o seu "angerismo", a sua pulsão underground gay demasiado auto-afirmativa (para o meu gosto, pelo menos), puxa a sua visão política do mundo para o domínio, não raras vezes gratuito, da apropriação sexual. Escrevo isto sobre Jarman, mas podia estar a escrever o mesmo sobre Fassbinder ou o já citado Kenneth Anger, cineastas que também nem sempre conseguem, ou querem, refrear a tentativa de politização da sua particular experiência da sexualidade. Como se a homossexualidade fosse um panfleto, que é sempre oportuno distribuir junto com "algo mais"... atitude moral com a qual não me identifico.

Todavia, este filme de Jarman, que surge no festival a representar os anos 80, em comemoração dos 50 anos da Viennale, será, obviamente, um objecto obrigatório para fãs do realizador. Para os outros, deixo a seguinte dica: ganharão em vê-lo quando estiverem numa de dar uma "segunda oportunidade" a um realizador que não adoram, mas que vos (sabe) intriga(r). Só pela "dança da noiva" o filme vale o risco.

(Este filme foi mostrado hoje no IndieLisboa. Não será reexibido. Porque compreendemos, mas não acompanhámos, os aplausos no final da sessão, deixamos este link para a sua edição inglesa em DVD.)

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