domingo, 29 de abril de 2012

Rua Aperana 52 (2012) de Júlio Bressane


O que Bressane ensaia aqui é uma despedida em forma de poema topológico, começando por filmar fotografias antigas, depois montando um fotodrama e, por fim, "sintonizando" as fotos de infância, amareladas pelo tempo, com excertos de vários filmes seus rodados nos mesmos cantos e recantos da sua cidade-mãe, o Rio. Quando entra na "fototrama", assim lhe chama Bressane, a auto-homenagem torna-se explícita e a ligação da paisagem ficcional com a paisagem fotografada começa a ser construída. Não sei ao certo se Bressante é bem sucedido nesta tentativa de raccord rememorativo, entre o espaço do seu cinema e o espaço da sua memória, de um passado seu que também é o passado de uma paisagem e de um país.

Tem momentos belos - a música e a presença de Buarque ou de Caetano, por exemplo - e os excertos dos seus filmes servem até de cartão de apresentação interessante (ainda que caótico e algo traiçoeiro para quem nunca viu um filme seu) à sua já extensa obra, ainda assim, este registo à Mekas não parece resultar totalmente. Bressane diz que procurava uma montagem que evocasse "estados de espírito" e que transformasse o espectador numa "nova testemunha da paisagem ficcional". Não me parece que esta "imersão" intimista seja fácil nem, muito menos, facilitada, porquanto para se ser uma nova testemunha tem de se já ter testemunhado alguma coisa aí - pela parte que me toca, vi "Matou a Família e foi ao Cinema" (1969), obra cujas afinidades estão bem mais num Glauber Rocha ("Terra em Transe") do que nas experiências avant-garde norte-americanas (Frank, Brakhage, Mekas, Menken, Cornell...), daí também este meu relativo "estranhamento" em relação ao registo poético-livre de "Rua Aperana 52". Nesse sentido, talvez este pequeno documento resulte apenas como complemento da sua obra (ou extra de luxo), espécie de última grande escalada às montanhas do Rio, aos lugares onde Bressane semeou imagens ao longo de várias décadas.

(O filme foi exibido ontem no IndieLisboa. Terá nova projecção no dia 6 de Maio, no Cinema Londres, às 23h15. Se estiver interessado, tente ser "testemunha" de alguns Bressanes, antigos e novos, antes de percorrer esta "Rua...".)

2 comentários:

Anónimo disse...

tem alguma maneira de eu baixar esse filme?
pois, nao o encontrei em nenhuma locadora

Luís Mendonça disse...

Desculpe, não he sei responder a essa questão. Vi o filme em sala, no festival IndieLisboa. Presumo que seja mais fácil pedir o acesso à obra através do próprio autor ou da sua produtora.

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